segunda-feira, 29 de novembro de 2021

A aceleração tecno-capitalista


«O mundo tecno-capitalista é um mundo de hiperconsumo que já não se explica pelo aparecimento de necessidades verdadeiramente novas, mas sim pela nossa preferência pela despesa em vez do tempo. Outra grande consequência desta aceleração tecno-capitalista é que o tempo, tornando-se um recurso cada vez mais escasso, se transforma num activo que as empresas tentam apreender. Esta captação do tempo que todos sentimos é uma das causas da grande transformação antropológica a que estamos a assistir: a substituição do “homo economicus” por um homem capaz de aceitar uma série de limitações à sua liberdade em troca de cada vez mais consumo, este é o homem a que chamamos “homo festivus numericus”. Tal como os químicos das empresas de cigarros foram pagos para tornar os fumadores cada vez mais viciados, milhares de investigadores e engenheiros são pagos para captar a nossa atenção, para transformar o nosso tempo num activo valorizável. Assim, juntamente com o mercado de dados, está a ser criado um novo mercado para o tempo. (…)

O modelo da “start-up” é simbólico do princípio de aceleração que caracteriza o nosso mundo. Alguns querem fazer disso um modelo de sociedade que supostamente conduzirá as pessoas em direcção a mais felicidade e harmonia. (…)
Na maioria das empresas, a urgência tornou-se a norma. Sistemas organizacionais (just-in-time) mas também métodos de gestão acompanham e amplificam este sentido de urgência, o que pode ter consequências desastrosas. Não só o ritmo frenético mina a motivação dos empregados, como também o foco da empresa pode ser disperso em várias direcções, o que pode confundir os clientes e prejudicar a marca.
As mais recentes epidemias de gestão em voga, as metodologias “Ágil” e “lean startup”, transformaram milhões de empregados em cobaias. (…) A gestão impõe o princípio da mudança em nome da mudança. Esta forma de desumanização é largamente alimentada pela tecnologia, particularmente através de sistemas de monitorização do desempenho e ferramentas de análise comportamental. Esta vigilância, cada vez mais generalizada, cria um ambiente tóxico e desmoralizante que tem impacto na dignidade, liberdade e autonomia dos empregados. (…)
(…) A fast food, o speed dating e os sonos curtos são testemunhos deste fenómeno. Para chegarmos a este ponto, foi preciso ajudar o indivíduo a concentrar-se no que é importante: ele próprio. O símbolo desta era narcisista é a “selfie”. Tal como o lendário Narciso, a pessoa a quem chamamos “festivus numericus” é fascinada pela sua imagem e informa o mundo inteiro em tempo real do que está a fazer. A sua vida social é agora passada no seu telemóvel. A partir do momento em que acorda, toda a sua atenção está focada na gestão dessa imagem. Os teóricos comportamentais há muito que teorizaram como condicionar os seres humanos, utilizando diferentes métodos de estimulação. Apoiando-se na poderosa necessidade de pertença do “festivus numericus”, estas aplicações tocam em todos os botões que captam a sua atenção. Assim, o nosso tempo está a tornar-se desumano, como se um processo técnico estivesse em vias de conduzir os nossos cérebros, os nossos corpos, as nossas relações, a nossa agenda e, em última análise, a totalidade da nossa sociedade.(…)
Georges Bernanos escreveu que uma civilização não se desmorona como um edifício, desaparece com a espécie de homem, o tipo de humanidade, que dela emergiu. Os economistas fariam bem em ouvir esta reflexão, que é semelhante à do sociólogo alemão Ferdinand Tönnies quando fala da passagem de uma comunidade calorosa, natural e espontânea, baseada na aliança do sangue, no convívio dos vizinhos e na coesão das crenças, para uma comunidade fria, artificial e constrangida que se baseia no contrato de interesses, nas vantagens que uns podem obter de outros, e na lógica da ciência. Ele antevia já o advento de um mundo em que o homem seria libertado da maioria das suas obrigações para com os outros e deixaria de sentir a necessidade de relações sociais para se engrandecer. Este rebaixamento da sociabilidade caracteriza o tecno-capitalismo ao ponto de nos interrogarmos agora sobre o advento de um "mundo sem contacto"! (…)»

terça-feira, 22 de junho de 2021

Monarquia - é a melhor forma de governo

 Quando Aristóteles e Santo Tomás dizem que a Monarquia é a melhor forma de governo, o que eles levam em consideração é que, em teoria, essa instituição teria contida nela os outros elementos representativos. Uma monarquia temperada por uma aristocracia (pois o Rei provém desta classe) e, por fim, por uma participação popular (uma timocracia ou politéia e não uma democracia no sentido moderno).

O "Rex" é apenas o princípio ordenador donde os outros elementos gravitam, por isso ele deve ter uma base fixa - daí a legitimidade pela sucessão e vitalicidade do cargo. As"monarquias" eletivas, como por exemplo, o reino dos visigodos na Espanha pré-islâmica, eram sistemas precários porque faltavam uma verdadeira monarquia (hereditária), e por isso tal revesamento de poder impedia uma continuidade do governo e da ordem, já que o poder era disputado por facções que votavam para o trono.
Em Roma, por exemplo, o Imperador não era um Rei, era como um ditador vitalício e por conta do cargo não ser hereditário, as disputas políticas levavam o Estado e a sociedade para crises, guerra civil e fragmentação territorial. O Imperador era na verdade um Príncipe, de Princeps, que significa Primeiro, o primeiro entre os senadores. O Império Romano não era uma monarquia, mas uma república ditatorial.
Por outro lado, uma monarquia absoluta para Aristóteles seria uma forma de degeneração, uma tirania. Por outro lado, uma Monarquia parlamentar seria uma mera República instável (tal como fora o Império Romano e a monarquia visigótica) com um rei como um elemento figurativo entre facções oligárquicas na disputa do poder. O rei, como elemento ordenador, deve ser aquele que harmoniza as disputas dessas facções direcionando-as a um fim maior, portanto ele deve ter um poder de fato (diferente das monarquias modernas parlamentares) e não ser algo meramente ilustrativo. Todavia não um poder absoluto, tirano, mas um poder que permite a atuação política dos outros elementos sociais: a aristocracia e o povo.
Logo, poderíamos imaginar como seria uma monarquia ideal, em termos aristotélicos: Por cima teríamos o Rei, a autoridade suprema, o princípio ordenador no qual todos os outros elementos gravitam (Chefe de Estado e Poder Moderador); por baixo teríamos um Senado composto por uma aristocracia, com cargo vitalício e que iria eleger um cônsul (chefe de governo) com cargo de 1 ou 4 anos. Por baixo teríamos uma câmara corporativa cuja função é conter representantes de categorias profissionais e demais grupos sociais e criar leis que só seriam aprovadas por uma revisão e aprovação do senado, a câmara alta.
Mesmo na câmara baixa, a câmara corporativa, os representantes dos grupos sociais são eleitos por membros excelentes das categorias e não por todo o povão, pois assim cairíamos na degeneração democrática na concepção de Aristóteles, que é aquela que o povo não significa um grupo seleto entre a população (os cidadãos de fato), mas significa toda a "massa".
A democracia, como forma de governo, não é algo ruim, mas no sentido moderno, com o sufrágio universal, onde as massas votam, sim é algo péssimo. BB