Via Acção Integral
No dia em que foi a enterrar
com honras de Estado um vil e reles traidor, combatente
"anti-fascista", inimigo de Deus, da Pátria e do Rei, ponhamos os
olhos na campa rasa e simples de António de Oliveira Salazar. Eis um homem
modesto, do povo autêntico da Beira, que nunca desonrou os seus antepassados
lusos, e nunca quis parecer mais do aquilo que era.
Devo à Providência a graça
de ser pobre: sem bens que valham, por muito pouco estou preso à roda da
fortuna nem falta me fizeram nunca lugares rendosos, riquezas, ostentações. E
para ganhar, na modéstia a que me habituei e em que posso viver, o pão de cada
dia, não tenho de enredar-me na trama dos negócios ou em comprometedoras
solidariedades. Sou um homem independente.
Nunca tive os olhos postos
em clientelas políticas nem procurei formar partido que me apoiasse mas em paga
do seu apoio me definisse a orientação e os limites da acção governativa. Nunca
lisonjeei os homens ou as massas, diante de quem tantos se curvam no Mundo de
hoje, em subserviências que são uma hipocrisia ou uma abjecção. Se lhes defendo
tenazmente os interesses, se me ocupo das reivindicações dos humildes, é pelo
mérito próprio e imposição da minha consciência de governante, não por ligações
partidárias ou compromissos eleitorais que me estorvem. Sou, tanto quanto se
pode ser, um homem livre.
Jamais empreguei o insulto
ou a agressão de modo que homens dignos se considerassem impossibilitados de
colaborar. No exame dos tristes períodos que nos antecederam esforcei-me sempre
por demonstrar como de pouco valiam as qualidades dos homens contra a força
implacável dos erros que se viam obrigados a servir. E não é minha a culpa se,
passados vinte anos de uma experiência luminosa, eles próprios continuam a
apresentar-se como inteiramente responsáveis do anterior descalabro, visto
teimarem em proclamar a bondade dos princípios e a sua correcta aplicação à
Nação Portuguesa. Fui humano.
Penso ter ganho, graças a
um trabalho sério, os meus graus académicos e o direito a desempenhar as minhas
funções universitárias. Obrigado a perder o contacto com as ciências que
cultivava, mas não com os métodos de trabalho, posso dizer que as reencontrei
sob o ângulo da sua aplicação prática; e, folheando menos os livros,
esforcei-me em anos de estudo, de meditação, de acção intensa, por compreender
melhor os homens e a vida. Pude esclarecer-me.
Não tenho ambições. Não
desejo subir mais alto e entendo que no momento oportuno deve outrem vir ocupar
o meu lugar, para oferecer ao serviço da Nação maior capacidade de trabalho,
rasgar novos horizontes e experimentar novas ideias ou métodos. Não posso
envaidecer-me, pois que não realizei tudo o que desejava; mas realizei o
suficiente para não se poder dizer que falhei na minha missão. Não sinto por
isso a amargura dos que merecida ou imerecidamente não viram coroados os seus
esforços e maldizem dos homens e da sorte. Nem sequer me lembro de ter recebido
ofensas que em desagravo me induzam a ser menos justo ou imparcial. Pelo
contrário: neste país, onde tão ligeiramente se apreciam e depreciam os homens
públicos, gozo do raro privilégio do respeito geral. Pude servir.
Conheci Chefes de Estado e
Príncipes e Reis e ouvi discretear homens eminentes de muitas nações,
ideologias e feições diversas sobre as preocupações de governo, os problemas do
Mundo ou as dificuldades dos negócios. Pude comparar.
E assim, sem ambições, sem
ódios, sem parcialidades, na pura serenidade do espírito que procura a verdade
e da consciência que busca o caminho da justiça, eu entendo que posso trazer ao
debate um depoimento.
António de Oliveira
Salazar in «Discursos
e Notas Políticas».
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