segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Vira-se o feitiço contra o feiticeiro

Talvez pela primeira vez desde que a crise financeira se instalou na Europa em meados de 2009, que a elite política europeia começa a pagar forte e feio pelos erros que cometeu.

Até aqui agiu-se para salvar o dia-a-dia, criando-se toda a espécie de mecanismos e aldrabices financeiras para salvar estas duas grandes instituições que ameaçavam ruir:

- Setor Bancário europeu

- Dívida Pública do Sul da Europa

É natural que no olho do furacão (cimeiras e conselhos europeus), não seja possível à elite política refletir com o distanciamento e a abstração necessários à compreensão de um problema desta natureza e dimensão.
Por outro lado, a coragem que é necessária para o fazer também escasseia, logo, esta dicotomia entre decidir já o que é difícil ou decidir depois, tão desafiante para o cérebro humano, acabou por, mais uma vez,  conceder privilégios ao decidir-se depois o que é difícil, ficando já decidido o que é fácil.
E o que se decidiu foi:

- Ou emitir dívida recorrendo a credores internacionais (ESM e EFSF)

- Ou recorrer à impressão monetária, quer sob a forma de emissão de dívida (LTRO 1 e 2) ou  aquisições de dívida soberana (Trichet e OMT de Draghi)

Parecia fácil, não criava grandes chatices no presente, e algures no futuro as coisas tenderiam a resolver-se. A dívida pagar-se-ia porque com alguma austeridade os países punham as suas contas em ordem e rapidamente começariam a crescer, liquidando dívidas com as novas receitas fiscais.

Foi este o pensamento dominante dos esperançosos um pouco por toda a Europa, sendo os políticos o farol desta gestão vigarice de espectativas.

A matemática, como tantas vezes escrevi no Contas, era uma linguagem chata de se aplicar quando se tentava explicar às populações o que se estava a passar. A classe política preferiu usar a semântica, o lirismo, a retórica e a demagogia. Assim, sim, era possível passar a mensagem que se desejava passar.

Só quem fez umas contas é que percebeu o logro, e quem não o fez, tinha tendência a acreditar nas aldrabices que ecoavam nos meios de comunicação.

O FMI, num verdadeiro ato de contrição, em 2 semanas veio referir aquilo que a UE vinha a esconder há muito tempo para debaixo do tapete:
As Contas que se fizeram para correlacionar a austeridade com crescimento económico são um disparate.
A Grécia não se safa nem com austeridade nem sem austeridade. A sua dívida é de tal forma um Monstro que precisará de um segundo perdão em menos de 1 ano.

Só que desta vez a sugestão do perdão não é para com os privados, que já levaram com a cacetada em Março, mas sim para com os credores institucionais, aqueles que respondem pelo ESM, EFSF e BCE.
E quem são eles? O Bundesbank, os contribuintes alemães, franceses, italianos, holandeses, e por aí fora.

Esta sugestão do FMI é o primeiro indício de que as políticas executadas desde meados de 2009 começam a virar-se contra aqueles que as promoveram.
Afinal, a ajuda aos países mais fracos tem um custo.
Ninguém quis estudar o cenário e respetivas consequências à escala europeia caso um dos países entrasse em bancarrota.
Ninguém gosta de fazer cenários pessimistas, excepto aqueles que se tentam precaver para o pior. Haaa, mas a esses dá-se-lhes um nome: catastrofistas. Assunto resolvido.

Mais uma vez digo, agora é tarde de mais.
E Portugal pode tirar já o ticket, porque convêm ser dos primeiros a ficar na fila de espera.

Tiago Mestre

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