No dia 18 de Setembro, os residentes da Escócia votarão em um referendo pela independência em relação ao Reino Unido, após meses de intenso debate político entre as campanhas do Sim e do Não.
O problema é que, além dos inevitáveis argumentos emocionais e alheios à razão, até mesmo as declarações apresentadas como de natureza puramente económica ou financeira não estão se baseando em fatos correto ou em análises sólidas. O Partido Nacional da Escócia está recorrendo a argumentos puramente emocionais ao passo que todo o establishment em Westminster recorre à táctica do medo: a Escócia deve se manter dependente dos repasses de Londres, pois a alternativa da liberdade e da responsabilidade é pior.
Não há nenhum motivo para se afirmar com absoluta convicção que 5 milhões de escoceses não estarão em melhor situação caso o país se torne uma nação independente. Agora, é claro que a transição não será indolor. Boa parte dos escoceses terá de abrir mão dos subsídios e dos repasses assistencialistas, e encarar a nova realidade. Se fizerem a coisa certa, se adoptaram políticas sensatas, a diáspora escocesa — vários escoceses já fugiram das paisagens socialistas e provincianas do país em busca de mercados mais livres em outras nações — acabará e os emigrantes voltarão.
Caso saia do Reino Unido, a Escócia irá criar sua própria constituição. O país poderia aproveitar essa nova constituição para fornecer, de maneira mais clara e resoluta, uma maior protecção aos direitos de propriedade, ao mesmo tempo em que garantiria por lei a redução do escopo e da amplitude da intervenção política na área económica. Seu próprio sistema jurídico já fornece à Escócia uma vantagem nesse processo.
No que mais, contrariamente às ameaças de Westminster sobre não permitir que o país continue utilizando a libra esterlina, absolutamente nada impede que a Escócia independente adopte um sistema de Currency Board ancorando a nova moeda à libra esterlina ou ao euro. O Currency Board é um sistema que, quando correctamente implantado, impõe grandes restrições à capacidade do governo de fazer expansões monetárias, garantindo grande estabilidade à nova moeda. A recompensa por essa medida seria que a Escócia se tornaria um país de moeda confiável e robusta, podendo se tornar um entreposto comercial por seus próprios méritos.
Essa é a fórmula básica por trás do sucesso de Hong Kong. Vale lembrar que Hong Kong estava em frangalhos após a ocupação japonesa em 1945, e emergiu dos escombros para se tornar a economia mais livre do mundo, e uma das mais ricas em termos per capita. Os obstáculos superados foram muito maiores que os que a Escócia terá de enfrentar. Logo, não há motivos (de uma perspectiva puramente económica) para afirmar que a Escócia não pode se tornar um retumbante sucesso caso se torne independente. O segredo está na adopção de um livre mercado, na rejeição da intervenção estatal, e na garantia de segurança jurídica.
Infelizmente, a maioria dos eleitores escoceses enxerga a situação por um prisma bem distinto. Mesmo os defensores da secessão acreditam que o petróleo do Mar do Norte será suficiente para manter tudo como está caso ocorra a independência, e que as receitas de petróleo e uísque pagarão as pensões e os programas assistencialistas. Mesmo uma boa parte dos secessionistas anseia por uma maior socialização dos meios de produção, fornecendo um lustre intelectual para a maioria não-pensante que simplesmente quer ganhar mais em troca de menos esforço. Mas a independência significa abrir mão da segurança e do proteccionismo fornecidos pela União, além dos subsídios propiciados pelos impostos pagos pelos ingleses.
Segundo as estatísticas publicadas pelo Tesouro britânico, os gastos governamentais com serviços públicos na Escócia chegaram a £10.152 per capita em 2013. Enquanto isso, a média do Reino Unido foi de £8.788. Diga isso a uma família escocesa de quatro pessoas e tente convencê-la quanto à secessão. Igualmente, o total de empregados no sector público na Escócia é de 22,1% da população total empregada. Na Inglaterra, esse percentual é de 18,8%. Essa dependência também terá de ser revista. Diga isso aos 566.300 funcionários públicos escoceses, cuja maioria dos salários é repassada directa ou indirectamente por Westminster.
Muito tem sido falado sobre as dificuldades da separação, e os problemas certamente existem. A ameaça sobre a proibição da libra já foi mencionada, e há também a pendência sobre qual fatia da dívida pública do Reino Unido terá de ser arcada pela Escócia independente. Mas nada disso é novidade para o governo britânico, que já fez vários acordos financeiros com uma diversa gama de países recém-independentes que saíram do Império Britânico. Não obstante as ameaças de políticos londrinos, o processo não tem de ser difícil ou complicado.
Bancos e grandes empresas com sede na Escócia já ameaçaram sair do país. No que tange à localização das sedes, isso é realmente pouco importante em um mundo globalizado. Já a indústria pode facilmente ser estimulada a permanecer na Escócia por meio de um sistema tributário mais amigável e com impostos mais baixos Se os defensores da secessão estiverem correctos quando afirmam que a Escócia poderá negociar sua permanência na União Europeia, então a Escócia poderá desempenhar a mesma função que Hong Kong desempenha no território chinês.
As ameaças de Westminster são um mero jogo de cena politiqueiro, e uma negação de tudo que é possível de ser alcançado caso a Escócia adopte um livre mercado. Por outro lado, o establishment político de Edimburgo é tão despreparado, que nem sabe como responder aos desafios económicos formulados por Londres. Os políticos escoceses pró-independência nem sequer mencionaram um Currency Board como resposta à ameaça da exclusão da libra esterlina.
Como escocês, gostaria muito de ver o país se tornar livre, não obstante a total ausência de um plano económico realista. A independência libertaria a Escócia da tirania económica dos subsídios da Inglaterra, e a nação finalmente seria forçada a adoptar mercados mais livres e a viver de acordo com seus próprios meios. Essas condições são os pré-requisitos mais básicos para que o país alcance o indubitável potencial económico que sempre lhe foi negado como membro dependente da União.
No entanto, creio já ser quase certo que os escoceses irão rejeitar e optar por se manter dependentes dos repasses de Londres, pois a alternativa da liberdade e da responsabilidade é pior.
Alasdair Macleod
4 comentários:
Caro Vivendi,
Excelente escolha para dar o mote para hipótese tão rara de uma secessão na Europa. Parabéns por trazer à nossa consideração as palavras de A. Macleod.
Mesmo se o texto contempla aspectos (preocupantes para quem contemple o panorama da Liberdade, mas possíveis) que podem indiciar que a secessão até pode vir a ser apenas uma troca de soberanos...
Pode dizer-me onde está o original em Inglês?
Obrigado, mais uma vez.
Saudações,
LV
Caro LV,
http://bastiat.mises.org/2014/08/a-free-market-case-for-independence-lets-make-scotland-like-hong-kong/
Abraço.
As aparências iludem:
Aquilo a que se assiste na Escócia e na Catalunha, mas igualmente na Bélgica, na Córsega e em Itália é - aceitemos de barato - uma prodigiosa obra de engenharia que visa partir os Estados existentes, desagregá-los para, sobre os cacos, inventar a unidade e decretar a cidadania europeia. Só não vê quem não quer.
Vivendi,
Obrigado.
majoMo,
Mas seguindo esse raciocínio, não podemos concluir pela impossibilidade de um super-estado? Não estariam disponíveis as comunidades mais pequenas digamos assim, em defender-se face a esse super-estado? A menos que ele se preparasse para a guerra e tomasse pela força essas comunidades.
Mas espere… não estão os estados-ainda-existentes (EUA e Espanha, por exemplo) a fazer isso mesmo, a tornar as suas forças policiais em corpos para-militares? Upps se calhar já lá estamos e nem demos por isso.
Saudações,
LV
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