terça-feira, 3 de dezembro de 2013

A eletricidade continua a ser "gerida" por políticos

Para os leitores mais curiosos com a conversa das energias renováveis, certamente que não irão estranhar a notícia:

Subsídio às renováveis e cogeração atinge 28,5% da factura da electricidade

Sobrecusto da produção do regime especial dispara em 2014 para a marca histórica de 1,7 mil milhões de euros, agravando o peso nos custos do sector.

Se bem se lembram aqui no Viriatos e ainda no Contas Caseiras, a história era simples:

Para estimular os instaladores e produtores de torres eólicas, o Estado iniciou a partir de 2005 uma campanha massiva de estímulo às renováveis, financiando o preço do kWh muito acima daquilo que pagava às centrais térmicas: a gás natural e a carvão.
A malta entrou à força e tudo corria sobre rodas, até que um ex-presidente da ERSE (Jorge Vasconcelos) decidiu informar Manuel Pinho, ex-Ministro da Economia, de que os sobrecutos das renováveis iriam obrigar a aumentar logo em 2007, acho eu, o preço da eletricidade em 15%. Um escândalo!
Vasconcelos demite-se e Pinho inaugura o défice tarifário, que é como quem diz, começámos a pedir dinheiro emprestado para financiar as eólicas.

Para agravar a situação, percebeu-se também à posteriori que afinal o vento era demasiado intermitente, ao ponto de obrigar a instalar mais centrais térmicas a gás, iguais às que já havia antes das eólicas, para compensar a falta de vento. Mais um investimento que também não estava no programa..

Nunca ninguém quis pegar o touro pelos cornos, mesmo os atuais governantes, e a dívida correspondente aos défices tarifários anuais lá vai subindo alegremente desde 2007. Com este défice horroroso em 2013, a dívida já deve rondar os 5 ou 6 mil milhões de euros, apesar de ser um buraco que não aparece referido nem em OE nem em lado nenhum.

E nós, portugueses, que muito pedíamos aos governos que fomentassem as eólicas, porque vento era coisa que não nos faltava, não sei se se lembram desta apologia naquela época, acabámos por ter aquilo que merecíamos: mais 6 mil milhões de dívida a transitar para 2014 e a crescer bem, que um dia emergirá e terá que fazer parte das contas públicas, em paralelo com a dívida da CP (outros 4 mil milhões) e mais uns buraquitos aqui e acolá que ainda faltam destapar.

É triste andar a escrever sobre estas coisas desde pelo menos há uns 3 anos e ver que tudo continua na mesma, excepto uma coisa: o aumento da dívida do défice tarifário.

Tiago Mestre

2 comentários:

Anónimo disse...

tudo igual nao esta, mas ainda nao e o correto, muito ja foi feito nos ultimos dois anos contra todos os lobisa possiveis, mas a troika como ainda vai ficar mais um tempo isso vai ao sitio

Tiago Mestre disse...

Sim, tens razão. Nas PPP's rodoviárias conseguiram cortar aproximadamente metade do valor anual que estava pensado para os próximos anos, de 1000 milhões para 500 milhões. É obra! E cheguei a escrever sobre isso não há muitos meses.

Mas na eletricidade, o que se fez foi cortar (pouco) nos CMEC, que curiosamente já existiam bem antes das eólicas, do tempo do Mira Amaral, mas a que ninguém se opunha, até vir agora a troika pedir cortes.

Nas renováveis, como podes ver pelos números, em 2014 rondaremos os 1,7 mil milhões, quando em 2008, 2009, 2010 e por aí fora o valor rondava entre os 500 e 800 milhões anuais, dependendo de um vasto conjunto de variáveis, como a venda das licenças de carbono que ajudava a atenuar o custo das eólicas. Em 2013 e 2014 haverá poucas vendas de emissões de carbono e o icebergue emerge ainda mais.

É típico nos negócios que o Estado faz com os privados assumir uma despesa fixa, que é facilmente quantificável, coberta por uma receita variável, em tudo dependente da volatilidade da economia. Se tudo corre bem, é uma maravilha, se corre mal, não há coragem política para o reconhecer e toca de inventar mecanismos de crédito para tapar buraco. No fim seremos todos chamados a contribuir, e quem foi cobarde fica a dar aulas numa qualquer universidade estrangeira. É tão bom.