terça-feira, 27 de maio de 2014

O papel de bonzo


Um dia Seguro iria perceber e consciencializar-se de que mais não fez do que protagonizar o papel de bonzo que lhe escolheram, o de idiota útil ou de sentinela à caserna enquanto o resto da malta afiava finamente os punhais nos seus aventais de cabedal e treinava com precisão a sua pontaria com os revólveres. Nem sei como não compreendeu antes, face aos papelões que o papel para ele escolhido obrigava a fazer, as inconsistências, os disparates atrás uns dos outros, os exemplos históricos de Constâncio, Marcelo, Marques Mendes e muitos outros antes destes que caíram em esparrela semelhante. Só um cego (e mesmo assim estará por demonstrar) não veria nas atitudes de Soares o empunhar das baionetas. Só um surdo não se assustaria com o silêncio de tantos camaradas, desde a campanha à noite eleitoral. Só alguém completamente desprovido de tacto não sentia as armadilhas que lhe foram colocando ao longo destes anos, e é preciso não ter gosto nenhum para colocar os amigos de Sócrates nos lugares europeus. Nem coluna vertebral. Só um pau mandado insensível se recusaria a penitenciar-se perante os portugueses pelo mal que o PS lhes tinha feito com a bancarrota.

Seguro foi caminhando alegre e inconscientemente no caminho que os seus camaradas lhe prepararam. Em condições normais, seria de meter dó e até teria pena do sujeito. Mas como ele criou uma realidade fantasiosa nos últimos três anos, e que sempre critiquei, agora não me incomoda nada que o país das maravilhas em que ele se deixou viver o tenha confundido até mesmo à porta de casa, ao vizinho do lado. Fez a sua caminha e meteu lá quem quis, não venha agora queixar-se de que cheira mal.

Os camaradas vão correr com ele, rapidamente e em força. Das trincheiras de Seguro ouvem-se ainda, aqui e ali, alguns disparos para o ar, mas sem convicção, pontaria e inúteis contra carga pesada: José Lello já fez saber que no PS andavam sedentos de mudança. Quantos? “Milhares”, responde ele do alto daquela superioridade moral socialista, tão pior quando se abate sobre os seus. Os críticos saem da toca aos magotes e armados até aos dentes. A indefesa Maria de Belém Roseira estremece na voz e diz que não fala mais. Assis anseia pelo voo para Bruxelas e Silva Pereira já deve estar a bebericar qualquer coisa no bar do aeroporto, rindo-se ao telefone com o seu mentor. A marca de Zorrinho passou a ser, estranhamente, o silêncio. E muitos indecisos em terra de ninguém perscrutam de onde virá o vento e, principalmente, para onde ele irá, enquanto se tentam abrigar dos obuses que vão caindo nesta guerra relâmpago. As empresas de telecomunicações esfregam as mãos e os telefones aquecem.

As tropas de Sócrates vêm aí, sedentas e esfomeadas. Já não conseguiam mais estar quietas. Um bando de animais ferozes, com António Costa à cabeça, Sócrates a fazer de lamparina alumiadora, farol daquela gente, e militares de carreira aventalense e castrense a ulular assustadoramente, lança-se sobre este pobre país e sobre os portugueses sem que nunca antes se tenha arrependido da bancarrota em que nos fez cair aquando da sua última gestão. E provavelmente para tentar repetir a façanha, agora que o esforço dos portugueses juntou umas parcas economias nos cofres que antes os socialistas deixaram vazios. Era fatal como o destino. Só Seguro não viu, entretido a desenhar um programa de governo perfeitamente irreal e a alinhavar o discurso da vitória que antevia. Ou anteviam por ele. Ou mandavam-no antever. Seguro, o tal que se continua a afirmar pronto para governar o país. Alguém devia dizer-lhe, coitado.

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