Por Jaime Nogueira Pinto,
Esta crise doméstica do princípio do Verão é a prova provada de que o bem público e o sentido de Estado estão ausentes como valor e como critério de actuação dos políticos portugueses.
E, a contrario, é a confirmação de que os interesses pessoais e partidários, a vaidade de ter a última palavra, a obsessão da retórica ideológica, o prazer da vingança na praça pública das humilhações privadas, são os vectores e os motores da actuação de quase todos.
Tudo se passou, como uma sucessão de mãos e vazas de um poker sintético, em que o prazer de surpreender os parceiros e de cobrir a aposta deles dominou qualquer outra preocupação. Até de ganhar.
Desta vez os eleitores e cidadãos aperceberam-se da vacuidade do jogo e indignaram-se, ao dar-se conta que estes bluffs e contra-bluffs a divertir os jogadores são pagos por eles, que estão de fora e bem de fora da partida. Mas pagam a conta. E que a conta do jogo, depois destas duas semanas, entre a degradação dos juros da dívida, as perdas nas bolsas, o downgrading dos bancos, representa um suplemento de peso no fardo que vão carregar e pagar nos próximos anos.
Assim, ao aproximar do quadragésimo aniversário do regime, mais se acentuam os seus custos sociais e económicos, sem que a demagogia e a propaganda (assentes na demonização do Estado Novo e consequentes alegrias da restauração democrática) consigam já sensibilizar muito as massas ‘antifascistas’.
As alternativas para Portugal estão, hoje, entre o protectorado e a bancarrota: o protectorado é sermos os bons alunos da Europa, cumprir à risca os mandatos da troika, deixarmos que os outros – os europeus e os estrangeiros – nos obriguem com o seu mandato a voltar a ser um país normal, saindo desse protectorado. A bancarrota é não fazermos nada disto, ou não fazermos o suficiente e acordarmos um dia com os ATM sem dinheiro e as consequências no meio da rua.
Os antifascistas de serviço – desde os veneráveis vultos do reviralho, obcecados em dizer e fazer tudo ao contrário do que Salazar diria e faria, aos bloquistas que repetem as enormidades da vulgata leninista – querem aproveitar a guerra psicadélica entre a coligação e o Presidente, para se escapulirem e passarem as culpas. Fazem de conta que os pecados e a crise começaram agora e que eles aí estão com receitas infalíveis para a cura. Por isso convém lembrar que esta gente foi a que fez a descolonização e as nacionalizações de qualquer maneira, quem manteve uma constituição socialista até tarde e quem semeou e impôs constitucionalmente os clichés ideológicos que bloqueiam a política, a economia, a sociedade.
Por muito que nos irritem os estados de alma das lideranças, os ajustes de contas despropositados, estes jogos a brincar aos políticos e os jogadores políticos, num terreno cada vez mais movediço, por muito que nos desgoste e indigne o espectáculo destes, os outros ainda conseguem ser piores. E a política portuguesa é hoje uma escolha entre inconvenientes.
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