Por António Ribeiro Ferreira,
E assim acaba a aventura de um emigrante que
sonhou ser possível mudar Portugal
Álvaro Santos Pereira chegou ao governo sem padrinhos do PSD ou do CDS.
Agora sabe que a economia real, a sério, é uma miragem neste país.
A remodelação do governo, em curso, que ficará fechada a meio da semana
se Cavaco Silva aceitar o novo acordo sólido e irrevogável proposto por Passos
Coelho e Paulo Portas até 2015, deixará pelo caminho Álvaro Santos Pereira,
ministro da Economia e Emprego. É fácil, é barato e não provocará o rasgar de
vestes de ninguém. Independente a sério, sem clientelas do PSD ou do CDS,
emigrante no Canadá, aterrou em Lisboa com uma bagagem cheia de sonhos. Sonhos
que passavam por muita mudança na economia, na real, na que implica mercado,
concorrência, regras de jogo transparentes e iguais para todos, e um Estado
regulador, facilitador e afastado de empresas e negócios.
Álvaro Santos Pereira devia ter pedido a demissão logo que percebeu que
neste país de doutores e aspirantes a doutores é um pecado mortal alguém ter a
ousadia de pedir com humildade que o tratem por Álvaro.
Álvaro Santos Pereira devia ter pedido a demissão logo que percebeu que
neste país em que o mercado é uma ficção e a concorrência um crime sem perdão,
cortar as rendas excessivas na energia, leia-se na EDP, e nas poderosas PPP que
tanto dinheiro deram e dão a ganhar a construtores civis, bancos, consultores
financeiros, escritórios de advogados e partidos políticos do arco da
governação é um suicídio político. Álvaro ficou e deixou sair o seu secretário
de Estado da Energia, expulso do paraíso por quem manda de facto no país.
Álvaro Santos Pereira devia ter pedido a demissão quando quis combater a
burocracia do Estado, que começa nos gabinetes do poder, passa pelas direcções-
-gerais, institutos, agências do ambiente, comissões de coordenação regional e
acaba no mundo autárquico e percebeu que era um combate desigual, impossível de
vencer num país em que o Estado foi há muito aprisionado pelos partidos que
assim controlam os investimentos, os negócios e os empresários. E quando
percebeu que a burocracia é o ganha pão de milhões e o fermento da corrupção
que grassa no país.
Álvaro Santos Pereira devia ter pedido a demissão quando percebeu que os
parceiros da concertação social vivem há anos à sombra do Estado e das migalhas
que caem da mesa do orçamento. Odeiam o risco, o investimento e qualquer sinal
de mudança é motivo para escândalo e pedidos lancinantes de intervenção de
poderes supremos que ponham na ordem quem quer mexer e agitar as águas do
pântano há muito instalado.
Álvaro Santos Pereira devia ter pedido a demissão quando percebeu que
falar em Portugal de reindustrialização, crescimento económico e investimento é
motivo de escárnio e maldizer. Álvaro Santos Pereira devia ter percebido que em
Portugal um bom ministro da Economia é o que dá negócios aos empresários do
regime e os protege de qualquer tipo de concorrência.
Dois anos depois de ter chegado do Canadá, Álvaro Santos Pereira está de saída do governo sem que uma luminária empresarial ou política do regime verta uma lágrima por este professor de Economia.
Álvaro Santos Pereira sai do governo e nos obituários políticos do
costume vai aparecer a história do Álvaro, dos pastéis de nata e da omissão
imperdoável de um ministro ter estado dois anos no governo sem ter decretado,
com a devida solenidade, que a economia portuguesa ia crescer por vontade do
governo e do Estado.
1 comentário:
Uma pena...Pelo menos já sabemos como sobreviver neste pântano...digo sobreviver, não prosperar...Esse é o nosso fado...
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