quarta-feira, 12 de junho de 2013

Vazelios: "Já ninguém acredita no Pai Natal"

(via Económico-Financeiro)
A mentira, o senso comum e a argumentação política

Vamos renegociar com a Troika. 

Os esquerdistas pensam que basta o Passos Coelho dizer que quer renegociar as condições do memorando e "os alemães ficam logo a tremer das pernas". Que, quando chegarem ao poder, vão dizer "Acabou a austeridade e começou a politica de crescimento" e, imediatamete a troika vai descer os juros dos actuais 3.2%/ano para 0.75%/ano, vêm pipas de dinheiro fresco e só vamos pagar metade do que devemos.

A troika e a Sr.a Merkel vão tremer tanto das pernas que vão dar origem a um tremor de terra.

Fig. 1 - Até pedi à Dr.a Filipa que organizasse, juntamente com o coro da FEP, uma manifestação contra a Troika (mas do tipo das da FEMEN).

Diz o relatório do FMI que se enganaram.
Mas o engano não foi as condições do resgate (original) serem muito duras mas o engano foi totalmente ao contrário: as medidas que hoje estão a ser aplicadas à Grécia (muito mais rígidas que as originais) deveriam ter sido aplicadas desde o primeiro minuto.
Dizem que acreditaram que com apenas um toquezinho a economia iria ajustar e não ajustou.
Para a próxima, quando houver um caso semelhante, têm que entrar logo a matar porque o dinheiro do FMI vem de países muito mais pobres que a Grécia (e que Portugal).

O problema são os factos. 
Os cipriotas falaram grosso, berraram e gritaram que era inconstitucional isto e aquilo e a Troika, mesmo a tremer, meteu-lhes a marretada do corte de 90% dos saldos bancários acima dos 100 mil euros.
Os gregos andaram em manifestações e gritaria a defender os direitos adquiridos. O tribunal constitucional veio dizer que era proibido despedir os funcionários públicos, blá, blá, blá. Em resposta, pumba, a TV grega pura e simplesmente fechou.
Claro que a RTP não se cansa de anunciar essa noticia porque estão-se a rever na coisa.
Será que os cipriotas não ouvem o Seguro?
Será que os gregos estão moucos ao Galanda?
Ou será que a Troika não são aqueles meninos de coro que os esquerdistas nos querem vender?
É que fome mesmo há naqueles campos de refugiados da Birmânia.

Fig. 2 - Pobreza é na Birmânia (Myanmar) onde o salário médio é de 0.25€/h e os dos rohingya ficam-se pelos 0.10€/h. O positivo é que não há desemprego nem baixa natalidade.

A mentira do Sócrates.
Portugal já foi 7 vezes avaliado pela troika e já houve várias alterações das condições do memorando inicial mas foram todas no sentido de diminuir as restrições e não aumentar.
Eu sei que o Sócrates é burro como uma porta mas como pode ele, depois de vincular o governo de Portugal (no caso, o Pedro Passos Coelho) a garantir para 2012 um défice orçamental  de 4.5% do PIB, afirmar que o Passos ter atingido um défice de 6.4% indica que está a ir além do que ele acordou com a troika?
Só pode estar completamente louco.
Mais burro ainda é ter negociado 3% para 2013 e o Passos ter conseguido renegociar para 5.5% e vir dizer que as condições agora são piorares que as condições iniciais.
O homem não só é burro como explora a burridade que existe dentro de cada um de nós.

Vejamos outra burridade - o cancro da dívida
Vamos imaginar uma pessoa que foi casada 6 anos com o Sócrates e que em 2010 lhe foi diagnosticado cancro da mama. Entretanto, divorciou-se e casou-se com o Passos Coelho. Passados 2 anos é perguntado à pessoa se, decorridos os 2 anos de casamento com o Passos, a sua saúde está pior do que estava quando se divorciou do Sócrastes.
A resposta foi que sim, que está pior.
Será que podemos concluir daqui que a pessoa estava a dizer que o Passos foi o responsável pelo degradar da sua saúde e que o Sócrates era um grande marido?
Numa sondagem do Expresso 75% do nosso povinho diz que estamos pior que há 2 anos mas não diz que isso seja culpa do Passos. Portugal sofria de cancro da dívida e está em quimioterapia. Apesar de estarmos a viver pior, isso é culpa do cancro da divida e não do tratamento.
O Sócrates ao dizer que estar pior quer dizer que ele foi um grande estadista faz-me lembrar um que se intitulava Chefe (no programa Hells Kitchen ) mas que não era capaz de fazer uma omolete.

A balança corrente - a verdade do INE.
Há pessoas que pensam que o dados que apresento são invenções minhas. Em particular, os dados sobre a Balança Corrente que mede as transacções com o exterior.
Mas não  e quando se olha para os valores que estão no sitio do INE temos que reconhecer sem qualquer reserva que durante os mandatos do Sócrates cada português se  endividava face ao exterior em 150€/mês e que, decorridos 2 anos de Passos Coelho, esse endividamento acabou. Não sou eu que digo isso, é o INE.
E, naturalmente, se nos endividamos em menos 150€/mês e ainda temos que pagar os juros da divida do tempo do Sócrates, vivemos todos pior. Seria algo nunca visto que estivessemos a viver melhor mas é totalmente demagógico dizer que vivíamos então melhor porque  a nossa economia era forte e o nosso país era bem governado.
Bullshiit. Era o cancro da dívida que fazia crescer as mamas.
Mas afinal o que é a verdade?
Mas comentaristas atacam com "há muita mais fome, miséria, muita mais não sei quê". Pode ser que haja mas o INE não consegue apanhar essas narrativas.
Concerteza que há sempre alguém que come menos que o que queria. Mesmo no mais rico dos países há pessoas nessa situação mas ninguém pode afirmar que há 2, 5 ou 10 anos havia em Portugal mais ou menos pessoas nessa situação porque não há dados credíveis sobre o assunto.
É normal que haja mais pessoas a passar necessidades porque, tendo o endividamento ao exterior parado, também foram prejudicadas as pessoas de menores recursos mas ninguém pode dizer que o Sócrates sem os 50 milhões de euros de endividamento conseguisse ter o povo contente como estava.
Mas, se ninguém recolhe os dados usando uma metodologia quantitativa rigorosa, cai na graçola do Gasparzinho (o investimento reduziu por causa das condições atmosféricas adversas).
Se a Birmânia se pudesse endividar 
50 milhões € por dia (como fez o Sócrates), o salário médio dos birmaneses subiria entre 70%  e 100%.. E como são tão pobrezinhos, a Troika poderia ajudá-los.
Isto dá uma ideia do impacto positivo que o endividamento externo tem no bem-estar das pessoas.
O problema é quando chega a hora de pagar.
O senso comum engana-nos.
Quantas horas demorará a Terra a fazer uma rotação sob si própria?
 Como o Sol ilumina a parte que está virada para si, sabemos que o alternar entre o dia e a noite resulta de a Terra rodar. Então, o senso comum diz que demora um dia, exactamente 24 horas. 
Eu estudei Física (até já dei aulas ao nível do 12.º ano) e nunca pensei que fosse diferente.
Mas está errado. Uma rotação da Terra demora 23h56m04s  (menos 3minutos e 56 segundos que as 24h)!
Para compreendermos o nosso erro temos que imaginar que a Terra dava uma rotação por ano. Neste caso não haveria alternância dia/noite porque a Terra teria sempre o mesmo lado virado para o Sol. Então, para haver 365.25 dias/ano, a Terra tem que dar mais uma rotação, 366.25 rotações/ano. Desta forma a Terra demora 23h56m04s/rotação e não 24h0m0s/rotação!
Pois é. O senso comum engana.
Em particular, houve comentaristas a dizer que Portugal está cada vez mais endividado face ao exterior.
As pessoas confundem endividamento do Estado Português (interna e externa) com endividamento externo português (público e privado).
O endividamento total dos agentes económicos residentes em Portugal face ao exterior atingiu o seu máximo nominal de 405.6 mil milhões € em meados de 2010 e está actualmente nos 385.2MM€ (-5.0%). Em termos de preços constantes (inflação de 2%/ano), a redução foi de quase 10%.
Fig. 3 - Evolução da divida externa nominal

Será que eu disse que o Passos Coelho é o responsável por isto?
Apesar de nos últimos 2 anos a Balança Corrente ter corrigido, eu disse no Poste que isso não se devia ao Passos Coelho ("e não o Passos Coelho pois nenhum homem tem essa capacidade").
De facto, o que corrigiu as nossas contas com o exterior foi a taxa de juro (rever, Porque é que a taxa de juro equilibra a economia). A subida da taxa de juro traduz as dificuldades dos residentes em Portugal obterem crédito externo. Com menos crédito (que se traduz numa taxa de juro mais elevada), reduziu o consumo (importações) e o investimento (também importações). Por esta razão é que o ajustamento da Balança Corrente aconteceu principalmente pela redução das importações.
Se os salários tivessem diminuído (e, consequentemente, os preços) o ajustamento teria acontecido principalmente pelo aumento das exportações (rever, Porque é que os salários equilibram a economia).
Se lá estivesse o Sócrates.
A Balança Corrente teria corrigido mesmo que lá continuassem o Sócrates + Teixeira dos Santos.
E no futuro, mesmo que os comunas formem governo, nunca mais será possível implementar as políticas despesistas públicas e privadas porque nunca mais teremos um acesso ilimitado ao crédito externo.
Enquanto que há 5 anos o mercado a divida pública era muito estável, agora é um mercado nervoso, de grande volatilidade. Ao mais pequeno problema, as taxas de juro voltam a díspar e o crédito seca. Por exemplo, no dia 21/Maio a nossa divida a 10 anos estava nos 5.2%/ano e hoje, decorridos apenas 21 dias, está nos 6.5%/ano.
Em apenas 21 dias, os títulos da divida pública a 10 anos desvalorizaram 11.6%.
No período 2003-8 a variação média  absoluta da taxa de juro entre dois meses contíguos era de 0.14 p.p. e, desde 2010, a  variação média absoluta mais que quadriplicou para 0.59 p.p. (a taxa de juro medida pelo indicador da divida pública a 10 anos, dados, BCE).
E como está  a posição liquida face ao exterior.
A nossa posição liquida externa (dívida menos crédito externos) está estável desde princípios de 2010, exactamente quando as taxas de juro começaram a subir de forma explosiva.
E se não fossem os 78 MM€ da ajuda da Troika e do BCE (a 3 ponto qualquer coisa por cento), a balança corrente (e a posição liquida) teria corrigido de forma muito mais violenta e rápida. Teria sido a bancarrota total.
Fig. 4 - Evolução da posição liquida externa nominal e a preços constantes (dados. Banco de Portugal)


Em termos líquidos a dívida oscila ligeiramente abaixo dos 200MM€.
A posição liquida é semelhante à divida pública porque os privados portugueses apenas  se conseguem endividar no exterior com garantias que são os seus activos (privados) no exterior mais a divida pública portuguesa. Então, a única garantia sem fundamento real (com origem em Portugal) é a divida pública.
Sabendo desta ligação, compreende-se que porque a Troika impõe limites ao défice público (que leva ao crescimento da divida pública). Se, por exemplo, os privados ficassem impossibilitados de usar a divida pública como garantia no exterior (e.g., o caso dos certificados de aforro), não haverá qualquer problema em termos défice pois será financiado internamente.
A economia ajusta sempre.
Seja qual for o governo, seja o Chaves, o Bukassa ou o Seguro, a Economia ajusta sempre seja pelos preços (taxas de câmbio, juros e salários) ou pelas quantidades (suspensão dos câmbios, limitações de crédito e desemprego).

A taxa de câmbio.
É o mecanismo mais rápido e eficaz para corrigir uma economia face ao exterior. De um dia para o outro a moeda pode desvaloriza 20 ou 30% o que implica uma redução imediata dos preços dos bens exportáveis face ao exterior e o aumento dos preços dos bens importáveis no interior.
Pela velocidade e magnitude com que a taxa de câmbio consegue ajustar as economias é que, tirando a zona euro (e mais 2 ou 3 pequenos estados relativamente à África do Sul e à Índia), todos os países do mundo têm moeda própria e uma grande percentagem mantém câmbios flexíveis.

A taxa de juro.
Quando há câmbios fixos, a outra variável de ajustamento que pode alterar-se rapidamente é  a taxa de juro. No caso português, de 2003-8 a taxa de juro (medida pelo indicador da divida pública a 10 anos)  esteve estável em torno de 4.11% e, desde princípios de 2010, a média foi de 8.45%.
Vendo as taxas de juro do lado do valor de mercado da divida pública, desde princípios de 2010 a princípios de 2012, as obrigações portuguesas a 10 anos desvalorizaram 60%, 4%/mês, e, desde então, recuperaram 2/3 do valor (ver, Fig. 5).

Fig. 5 - Evolução de uma obrigação portuguesa a 10 anos (cupão de 4.11/ano, dados sobre a taxa de juro do BCE, cálculos do autor)

Os salários e o desemprego
É uma certeza tão forte como a morte, é a descida dos custos do trabalho que reduz o desemprego. E nos custos do trabalho a parcela mais importante são os salários e a duração do horário de trabalho. Basta ver que nos países asiáticos (que adoptaram esta verdade) não existe desemprego. 
Em Portugal, a rua não permitiu que o governo desse passos no sentido de haver uma diminuição dos custos do trabalho. O governo tentou com o aumento do horário de trabalho em 0.5h/semana e com a transferencia da TSU do empregador para o empregado mas patrões e sindicalistas saíram à rua a gritar que não queriam.
Como não temos taxa de câmbio e o salário não ajusta em termos nominais, é a taxa de juro e o desemprego que têm sido o escape de ajustamento da nossa economia.
Ninguém que esteve contribuiu para a manutenção das coisas como estão pode dizer que está surpreendido por o emprego estar sempre a crescer.
É hipocrisia, burrice, loucura ou argumentação politica do tipo "quero mamar na coisa pública".

O ajustamento da Economia é como a Morte.
A morte pode vir mais cedo ou mais tarde, com mais ou menos sofrimento mas vem sempre.
Também a economia pode ajustar para um valor mais alto ou mais baixo do PIB, com maior ou menor desemprego e com maior ou menor sofrimento dos mais desfavorecidos mas acontece sempre.
Podem dizer que a N.S. de Fátima ou o PEC 4 nos teriam salvo mas isso são apenas ilusões para vender banha da cobra aos papalvos.


Fig. 6  - E como diz sabiamente o Vazelios, já ninguém acredita no Pai Natal.


1 comentário:

Anónimo disse...

Este artigo demonstra de uma maneira simples, que a dívida Portuguesa é completamente impagável...



Algumas boas almas, mesmo do campo do Governo, começam agora a defender a renegociação do memorando da troika, aproveitando - dizem - a autocrítica do FMI sobre a Grécia. Eu não sei se eles leram ou compreenderam o que diz o FMI sobre a Grécia - e que, numa palavra, é que a dívida grega é insustentável. E também não sei onde foram eles buscar a ideia de que agora é que é preciso renegociar. Nunca houve outra maneira de sair disto...

A dívida portuguesa, já aqui o escrevi várias vezes, é também indomável, insustentável, impagável e o que mais lhe queiram chamar. Basta olhar para as simulações. Partindo do seu nível de 2012 (123,6% do PIB), que já está ultrapassado, chegaremos a 2017 na mesma situação - sublinho na mesma situação - caso cresçamos 1% ao ano no PIB e produzamos 2% de saldo primário. Ou seja, se a economia em vez de contrair crescer e se os gastos do Estado (sem contar com os juros) sejam dois por cento inferiores às receitas.

Mas porque não havemos de crescer mais, como dizem os partidos da oposição. Vamos lá pôr três por cento (recordo que a própria Alemanha está com crescimento negativo, mas não custa sonhar). Pois, meus amigos, se crescermos três por cento e não tivermos défice (que é uma coisa tão extraordinária que é preciso recuar a Salazar e a Afonso Costa para nos recordarmos), conseguimos em 2017 passar a dívida pública para 121% do PIB. Querem mais? Descobrimos petróleo, ouro e exportamos 1000 Cristianos Ronaldos; crescemos 6% ao ano (assim tipo China); ao mesmo tempo não gastávamos no Estado nem mais um chavo do que aquele que recebemos, e conseguíamos em 2017 ter a dívida pública a representar 104,7% do PIB. Como veem, isto é simples... Tanto mais que numa visão mais realista - crescimento de 1% (e este é otimista) saldo primário de 1,5% (ou seja o Estado a gastar menos do que arrecada) a nossa dívida continua a subir e, em 2017 estará em 126%. Na verdade, eu não quero deprimir ninguém, mas se não houver crescimento e o Estado continuar a gastar mais do que ganha chegamos aos 150% de dívida num instante. E estes valores, superiores a 130% são considerados insustentáveis e apenas resolúveis pela insolvência. Ao contrário, depois da saída da troika, Portugal tem 20 anos para fazer descer o rácio da dívida a 60% do PIB (metade do que está atualmente).

Podemos, visto isto, dizer que o problema foi dos últimos dois anos - dá sempre jeito esquecer o passado. Ou podemos ser sérios e dizer que os últimos dois anos não ajudaram, mas valores destes, como todos sabem, são construídos com tempo.

Não sairemos daqui com um passe de mágica, como não entramos aqui com um passe de mágica. Foram anos de erros; serão anos de privações.