sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

Austeridadezinha não resolve nada, mas ajuda na confiança dos "mercados"

O Banco de Portugal revelou ontem o seu boletim estatístico, documento que aliás muito prezo pela quantidade de informação disponibilizada.

O que lá vem escrito já não é novidade nenhuma para nós:

A dívida pública na ótica de Maastricht situa-se nos 203 mil milhões de € em Dez-2012, ou seja, já bem acima dos 200 mil milhões, ultrapassando certamente os 120% do PIB. Em Janeiro andava pelos 190 mil milhões.
Os meus receios de que a dívida superaria os 200 mil milhões em 2012 estão confirmados.

São estes os resultados objetivos da austeridadezinha, e que sempre referi que não seria suficiente, tal é a dimensão do animal. Falta a austeridade a sério.

Nas empresas privadas a dívida mantêm-se nos 306 mil milhões, à semelhança do valor registado em Setembro pelo BdP.

Nas famílias, a tendência de redução parece-me já algo evidente: 168 mil milhões em Dezembro contra 168,7 em Setembro, e contra 174 em Jan.
Num ano, as famílias reduziram o seu endividamento em 6 mil milhões de euros. É obra.

Tudo somado, incluindo empresas públicas, temos 257 + 306 + 168 = 731 mil milhões de dívida total, ou 437% do PIB.

Se a taxa de juro média for de 5% para todo este stock, em 2012 tivemos que libertar aprox 36 mil milhões só para juros, equivalente a 22% do nosso PIB.

Basicamente, utilizámos entre 1/4 e 1/5 do nosso PIB para liquidar juros em 2012 !

Mas há notícias boas na imprensa:

A dívida a 10 anos baixou dos 7%. E isso é que é importante, porque significa que iremos regressar aos mercados da dívida em 2013, se Deus quiser. Mas eu não sei se Deus quer. Eu não quero!
Com os números e rácios de dívida que acima referi, não posso sequer considerar o que há de positivo em regressar aos mercados de dívida. Só se for para nos estatelarmos outra vez.

Ahh, mas esperem. Temos o BCE preparado para comprar tudo o que mexe e que cheire mal, atenuando a desconfiança dos investidores.

Se é assim, para quê então preocupar-me com rácios, dívidas e fundamentos? Para quê fazer contas? Para nada.
Como o juro já vai abaixo dos 7%, está tudo bem, certo?

Tiago Mestre

13 comentários:

Pedro Miguel disse...

Bom dia Tiago,

estou a falar de memória e posso estar enganado, mas o regresso aos mercados em 2013 é para para pagar dívida que vence.
Independentemente dos progressos que haja ou não, essa dívida vai vencer e é preciso pagar com dívida. Se o juro da renovação foi mais baixo, então melhor.

Só por si, se isso acontecer, significa uma melhoria ao nível do défice das contas do Estado.

Ricardo Anjos disse...

Não estou tão optimista como o Pedro Miguel!!!
penso mesmo que se "Voltarmos aos Mercados de Dívida", é para comprar champanhe do mais caro, e "festejar"!

está aqui um link que era útil publicar aqui no Viriatos... até no seguimento de outro post sobre ciclos económicos. Para aprender, e ficar boquiaberto!!!
http://youtu.be/mHLskCx4HaI
este homem percebe disto... no bullshit!

espero que gostem

vazelios disse...

Mas sem recorrermos aos mercados, a juros mais baixos, e sem assistência financeira, consegue o país continuar a funcionar?

Eu acho que temos sempre de nos endividar porque o dinheiro que geramos cá dentro não chega.

A ciência é, cortar cortar corta gastos, pagar dividas que se vencem e para isso é preciso recorrer a mais divida.

O essencial é cumprirmos com os compromissos e endividarmo-nos ao menor custo possível.

Eu não concordo com o recurso à divida recorrentemente, mas penso que nesta altura não é possível não o fazermos! Temos é de a renovar com custos mais baixos!

Ou então qual é a solução? Cortarmos até nos conseguirmos governar com o que temos? Era o ideal mas parece-me utópico no momento, dada a percentagem de divida que temos e à velocidade a que este ajustamento se está a fazer...

(ainda não vi o video do deathandaxes pode ser que me responda a esta questão)

Obrigado pela partilha

Anónimo disse...

Vamos ver por outro prisma, sem ser sempre negativos, as coisas nao estão melhores que no inicio do ano???

Vivendi disse...

Algumas coisas estão melhores e outras piores. É assim a vida...

O maior problema está na aventura fiscal de 2013 e o tipo de corte na despesa que está a ser preparado.


pedro disse...

sr Tiago: Estamos a adiar a nossa saída controlada do euro,pessoalmente, penso que vamos sair descontroladamente e aí vai ser mais doloroso. O euro está condenado.

pedro disse...

sr Tiago: Estamos a adiar a nossa saída controlada do euro,pessoalmente, penso que vamos sair descontroladamente e aí vai ser mais doloroso. O euro está condenado.

Vivendi disse...

Caro Pedro,

Tempo é dinheiro.

Quem está a ficar com a dívida pública portuguesa? Os bancos portugueses. E em Espanha? Os bancos espanhóis. E na Grécia? Os bancos gregos...

O último fecha a porta.

Pedro Miguel disse...

Vivendi, não é completamente verdade que sejam apenas bancos portugueses:

"Investidores internacionais aumentam exposição à dívida pública em 2,5 mil milhões de euros.

Os investidores internacionais voltaram a reforçar na dívida pública portuguesa em Outubro. Um mês antes, os investidores estrangeiros aumentaram a exposição à dívida soberana nacional pela primeira vez desde o pedido de resgate do país, em 605 milhões de euros. Uma tendência que é agora confirmada pelos dados ontem divulgados pelo Banco de Portugal. Em Outubro, os investidores estrangeiros voltaram a reforçar a sua exposição em 1,86 mil milhões de euros, elevando o investimento líquido para 2,5 mil milhões nos últimos dois meses. "

Vivendi disse...

Boas Pedro Miguel,

Consegues indicar qual é o peso atual dos estrangeiros em relação ao total na dívida soberana nacional?

Pedro Miguel disse...

Vivendi, não sei onde estão esses dados, mas irei procurar.

O que quis mostrar foi que de acordo com as informações mais recentes há um retorno da compra da dívida por estrangeiros e que não são apenas os bancos nacionais.

Pedro Miguel disse...

Vivendi, podes ver alguns dados nestes artigos:
http://www.auditoriacidada.info/article/os-donos-da-d%C3%ADvida
http://expresso.sapo.pt/quem-sao-os-maiores-credores-da-divida-publica-portuguesa=f662512

Vivendi disse...

Na realidade o “resgate” a Portugal, que nós estamos a pagar da forma que se sabe, é o resgate de bancos europeus que emprestaram acima das suas possibilidades.

Esta última frase do artigo do 1º link diz tudo. Há-de chegar o dia que as dívidas deixarão de ser sistémicas para a banca do norte.

Mas como é estranho dever tanto e ao mesmo tempo a dívida ser ainda tão mais obscura. E é bizarro como cidadão português comum não pode adquirir a dívida pública de Portugal.