terça-feira, 13 de agosto de 2013

Querido mês de Agosto


(Via Delito de Opinião)

Como é diferente o país de Agosto

por Pedro Correia, em 13.08.13

Zapo pelos canais de notícias, por estes dias, e não encontro nenhum dos comentadores televisivos que ainda há bem pouco prediziam as maiores desgraças neste país assolado pela crise. Onde está a douta eminência que no pretérito Inverno sentenciava que "a crise do sistema político português pode fazer o poder cair na rua até ao Verão"? Onde foi parar aquela alma perturbada que proclamava com solene gravidade há pouco mais de um mês: "Estamos perante a uma crise política de dimensões colossais, a nível de Portugal e da Europa." E o que será daquela voz tremebunda que em Julho assegurava aos assustados compatriotas: "Há uma situação de manifesta irregularidade no funcionamento das instituições"?

A banhos, dizem-me.

Foram todas a banhos - a douta eminência, a alma perturbada, a voz tremebunda estarão neste preciso momento a estender a toalha ao sol enquanto douram as requintadas epidermes. Durante todo o mês de Agosto, o país terá de resignar-se à ausência destas sumidades. Apesar da crise. Apesar do iminente segundo resgate que já anteviam em directo nas pantalhas. Apesar da provável saída de Portugal do euro, que tiveram o desassombro de profetizar. Apesar da possível fragmentação da pobre União Europeia, como não se coibiram de prever em tom caviloso. Apesar dos tumultos nas ruas que consideraram ser tão fatalmente inevitáveis como o Outono suceder ao Verão.

Ligamos as televisões e deparamos com amenidades. A esplanada da moda, a praia ideal, o passeio imperdível, a música mais em voga, as romarias campestres, os artesãos das aldeias, as iguarias inigualáveis. Retalhos de um discurso jornalístico que, à míngua da agenda política e sindical, transmite a ilusão de estarmos num país onde não sucede nada. O país de Agosto, antagónico daquele que as mesmíssimas televisões nos mostraram de Janeiro a Julho.

Em Setembro, vão-se as amenidades e regressam as sumidades. Mais bronzeadas, mais anafadas e ainda mais empenhadas em fazer soar o trovão do apocalipse. Levanta-se a toalha da areia, voltam a ouvir-se de novo frases como estas, ao ritmo de um thriller em sessões contínuas: "Portugal atravessa uma crise da qual muito dificilmente sobreviverá"; "Isto chegou ao fundo dos fundos"; "Assistimos ao apodrecimento das instituições".
Mal posso esperar.

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