terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Implicações constitucionais do Orçamento

Nos últimos tempos, temos sido constantemente bombardeados por notícias relativas ao pedidos de fiscalização sucessiva ao Tribunal Constitucional das mais diversas áreas, desde o Presidente da República, ao PS, PCP, BE e, agora ao que parece, o Provedor de Justiça. Santana Lopes já classificou como "correria ao Tribunal Constitucional" o que temos vindo a presenciar.

Pessoalmente, o que me choca não é o número de pedidos entregues ou a confiança que depositava em algumas destas instituições e, muito menos a ânsia visível do lado da oposição em barrar por completo a governação atual, sobrepondo interesses eleitorais aos interesses nacionais. No seguimento do meu artigo anterior, o que realmente me choca são os motivos pessoais que movem estas pessoas. Será legítimo que os partidos da oposição, o PR ou o PJ tentem revogar uma lei, neste caso o Orçamento, quando este penaliza os seus rendimentos enquanto cidadãos? E o Tribunal Constitucional? Será que os juízes votam em consciência quando sabem que ali têm o poder de veto sobre os cortes que lhes estão a ser impostos? Deviam estas decisões serem legítimas? Claro que sim, mas só se a Constituição fosse totalmente objetiva nos seus artigos. Agora quando o que temos é uma Constituição susceptível das mais variadas interpretações, muitas delas contraditórias, somos levados a acreditar que todas as decisões que se tomam são parciais e seguem por interesses pessoais e ideológicos de quem decide a constitucionalidade das normas. Portanto, creio que não podemos aceitar esta "legitimidade" de bom grado. 


O verdadeiro Presidente não fica em Belém, mas no Palácio Raton.
 Aqui é onde se passou a vetar leis.

De modo a esclarecer o leitor sobre as minhas maiores preocupações em todo este processo, vou proceder a uma divisão nesta exposição em duas partes: as causas que levaram a esta "correria" e as consequências destes atos, do meu ponto de vista, bastante irrefletidos.


Causas desta "correria"

Ao que consta nos meios de comunicação nacionais, as dúvidas constitucionais residem essencialmente no artigo 29º (suspensão do subsídio de férias aos Funcionários Públicos), no artigo 77º (suspensão do subsídio de férias aos Pensionistas) e no artigo 78º (Contribuição Extraordinária de Solidariedade). Estas são as 3 dúvidas de Cavaco Silva, 3 das 6 totais do PS, 3 das 10 totais do PCP e BE e as 3 do Provedor de Justiça.

Penso que o Prof. Pedro Cosme Vieira tem um opinião bastante estruturada e elucidativa sobre o caso, aqui sobre o OE e aqui sobre a CES (Contribuição Extraordinária de Solidariedade). Como me identifico bastante com estes dois artigos, escuso de me estar a alongar no artigo e a repetir por outras palavras o que na generalidade ele disse. De facto, os argumentos que ele expõe são bastante fortes, mas como o Vivendi já disse aqui no Viriatos, o TC poderá decidir uma coisa com base numa série de argumentos, ou decidir o oposto com base nos mesmos argumentos. Dou um exemplo: no ano transato, o TC chumbou a suspensão dos dois subsídios dos funcionários públicos com base no Princípio de Equidade. Com base no mesmo, também poderíamos admitir que os escalões do IRS são inconstitucionais pois todos deveriam pagar a mesma taxa (flat tax). Ou admitimos que casos diferentes devem ser tratados diferentemente, o que realmente apoio, ou se é para defender a equidade, que seja para todos os casos e não só para os que interessam aos constitucionalistas.


Consequências desta "correria"

Todos os dias vemos mais um "sábio" qualquer a afirmar a inconstitucionalidade do Orçamento ou como ele é um perigo para a democracia, alguns deles descrevendo cenários apocalíticos caso vá avante. Acrescentam que ele representa uma ferida na nossa lei fundamental. Os partidos da oposição viram o veto do TC de 2012 como uma nova forma de fazer oposição. O PS tem tentado através dos pedidos de fiscalização de atirar gasolina para a fogueira sem se queimar ao invés de dizer claramente onde discorda e de apontar caminhos alternativos. Não o faz porque não os existem, tão simples como isso. E se o fizesse seria insultado e responsabilizado por ter governado na maioria dos últimos 17 anos.

Comentário: A Constituição é a lei fundamental enquanto a realidade o permitir. E já há muito que a realidade desmentiu esta Constituição, o melhor que temos a fazer é acordar para a realidade, antes que caiamos da cama abaixo. Já ninguém pode levar a sério uma Constituição que defende tudo e o seu contrário. Todos eles falam das "implicações constitucionais" do Orçamento, eu cá prefiro falar das "implicações económicas" da Constituição. E que implicações económicas são essas?

A Constituição ao meter-se na vida política e restringir toda e qualquer atividade governamental paraleliza o país, criando um impasse. É isto que vivemos atualmente. Ninguém sabe o que acontecerá no mês seguinte, nem famílias nem empresas, pois a decisão do Tribunal Constitucional é totalmente imprevisível. E este cúmulo de imprevisibilidade (não se sabe se o Orçamento vai ou não ter que ser retificado) leva a um aumento da desconfiança dos agentes económicos, o que por sua vez conduz a uma queda no consumo e na poupança e a um desinvestimento na economia e sucessivamente a maiores níveis de desemprego. Isto pode, até, levar à fuga de capitais para o estrangeiro devido à cada vez maior instabilidade do nosso ambiente económico.

No entanto, ao que parece, o défice é ainda a única coisa que não é inconstitucional. Aquilo que nos conduziu até este buraco é o que ainda é constitucional, irónico não?


Bernardo Botelho Moniz

2 comentários:

Vivendi disse...

Excelente post!

vazelios disse...

Só não percebe a gravidade da situação, estes joguinhos nos bastidores, quem não quer.

Que saídas temos depois do chumbo, a concretizar-se?

Penso que vai ser um retrocesso de tudo (do pouco) que conquistamos até aqui, como alguma credibilidade, juros baixos, uma certa acalmia. Com esse passo até as (poucas) reformas que fizemos deixam de ter algum efeito.

Alias, eu até "concordaria" (economicamente) com o chumbo do TC, isto claro se houver um plano B de corte na despesa d 5 MMilhões. Mas depois era também inconstitucional.

Pus entre aspas porque não percebo da constituição ou de leis, logo não tenho de concordar ou não, se bem que até a minha irmã se a lesse também poderia opinar já que ela é tão vaga...