- Passos Coelho referiu a necessidade de cortar 4 mil milhões de euros na despesa, invocando que tal desígnio exige uma "refundação" das funções do Estado. Acho que é pouco, já que os cortes têm que andar na ordem dos 10 mil milhões só para começar, mas caramba, é melhor do que nada.
- Gaspar referiu há dias que a dívida portuguesa levará décadas a ser resolvida, dando assim uma dimensão mais real deste enorme problema.
- Álvaro referiu hoje que a queda das exportações em Setembro se deve sobretudo à diminuição das encomendas da zona euro, em linha com o post que publiquei aqui na passada sexta-feira, aquando da divulgação dos dados pelo INE.
- Já há "indícios oficiais" de que o défice em 2012 não será de 5% conforme renegociado com a troika em Setembro, mas sim de 5,x%, e caso a privatização/concessão da ANA não conte para o défice, conforme sugestão do Eurostat, podemos adicionar mais 1 ou 2% ao défice
- Só falta reconhecer que a recessão em 2013 não será de 1% mas sim de 2% e o défice não será de 4,5%, mas sim bem acima, a não ser que encontrem mais alguma privatização milagrosa.
Nunca é tarde demais para falar verdade, mesmo que esta seja dura de ouvir e difícil de suportar.
Tiago Mestre
3 comentários:
Para já seria preciso explicar às pessoas aonde o Estado gasta o dinheiro e ser o mais claro possível.
Depois é preciso lhes explicar que a despesa pública tem de estar o mais rapidamente possível 30 mil milhões mais baixa que em 2010 (>58 mil milhões). Porque de uma parte a receita pública está ainda claramente inflacionada pelas receitas extraordinárias dos últimos anos, e por outro lado, o que se retira da carga fiscal actualemente tenderá a diminuir nos próximos tempos porque ela claramente excessiva. Ou seja a receita fiscal "real" é muito mais baixa que os cerca de 64 mil milhões actuais (ronderá os 60 mil milhões). Por isso para estaremos certos de conseguirm excedentes orçamentais vai ser necessário a despesa baixar fortemente, assim caso a economia não cresça a dívida pública não aumentará mais porque teremos excedentes suficientes, como poderemos continuar a pagá-la.
Finalemente é preciso explicar aos portugueses que na verdade há 3maneiras de lutar contra a dívida e o défice:
1) Aumentar a receita.
2) Cortar a despesa.
3) Privatizar serviços.
A primeira, já se sabe, ninguém gosta menos quando temos o sentimento que vai incidir sobre outros e que vamos lucrar com isso de alguma forma. A segunda quase toda à gente concorda, mas ninguém quer tocar no gordo da despesa (ainda há quem julga que para resolver o problema basta pararmos de pagar os juros). A terceira poucos pensam, menos aqueles que têm interesse no estatuto actual.
Ora privatizar serviços é uma forma mais leve de fazer austeridade, porque não cortamos salários na FP, não reduzimos serviços públicos, "só" transferimos o encargo para o sector privada e fazemos com que as pessoas tenham mais directamente o pagamento de esses serviços.
Por isso é preciso explicar-lhes que as privatizações são boas porque evitam que se "ataque" directamente a eles, mas também porque a qualidade dos nossos serviços públicos têm sido desastrosa, logo isso significa que o Estado, os políticos, são incapazes de criarem sistemas minimamente justos e eficáze logo é melhor tentar outra via.
Mas para que as pessoas estejam convencidas da bondade do livre mercado é necessário o abrir verdadeiramente: liberdade de escolha, de entrada e de saída total. Sempre poderá haver mecanismos especiais de protecção para os mais carenciados, mas quem os solicitar deverá ser considerado como um devedor que deverá um dia reembolsar o que tirou a um dito momento.
André, como podes imaginar, concordo plenamente contigo.
As privatizações que referes como forma de atenuar a dor só ocorrerá se houver investidores dispostos a enterrar o seu dinheiro, mas infelizmente nisso eu tenho algumas dúvidas.
É verdade só que não há liquidez actualemente disponível para pagar aquilo tudo na forma actual, por isso é certo que cortes e reorganizações são inevitáveis. A diferença é que ao passarmos aquilo tudo ao Estado evitamos de fazer pagar toda à gente, e politicamente é interessante porque assim os políticos sempre podem dizer à população que a culpa é deles próprios; "não estais contentes porquê tudo privado e eles estão a cortar? Então porquê que não dais mais? Porquê que não ajudais mais as instituições sem buto lucrativo?" ou ainda "estais a ver os médicos e os professores como são: diziam que lutavam pela Saúde/Educação gratuita, porquê que não a fazem então agora que estão livres? Porquê que vos pedem tanto mas continuam a ganhar igual e a gastar o dinheiro igual? Se sabem melhor porque não fazem melhor?"
Quanto ao interesse dos investidores, eu acho que isso não é o problema principal, a questão é de saber se eles serão capazes de entrarem no mercado, e como justamente há pouco crédito isto pode dificultar as coisas. O que poderiamos eventualemente fazer é isto: o Estado dá literalemente todos os seus serviços (ou pelo menos todos os hospitais e escolas para começar) a quem estiver interessado. Podemos inclusive fazer privatizações "partilhadas": por exemplo não damos um hospital, damos sim os "custos" do hospital, assim pode haver vários investidores proprietários do mesmo hospital, só que quando a factura chega ao fim do ano têm de a partilhar em função do número de "acções" que detêm.
Podemos ainda no primeiro ano continuar a dar aos privados o que foi previsto o Estado gastar no OE, mas no segundo ano receberão um quarto a menos, no seguinte novamente um quarto a menos, assim o Estado diminui consideravelemente a despesa e permite aos actores privados organizarem-se.
Outra coisa que seria necessário explicar aos portugueses é o quê que significa e as consequencias de uma renegociação da dívida (> falência do Estado), e de lhes mostrar as consequências disso. É que as pessoas começam a olhar para o OE e vêem que não fosse os juros da dívida já estariamos em equilíbro, e por isso julgam cada vez mais que essa é a solução. Ora é muítissimo mais complicado que isso, e mesmo uma renegociação bem sucedida (basicamente uma em que os nossos credores aceitam de perder tudo) implica na mesma um corte de 30 mil milhões.
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